Odeio Iogurtes (título provisório) — Miguel Branco
Aquela vez em que desapareceste no centro comercial porque os pais não te compraram uns sapatos. Aquela vez em que nas férias, junto à piscina, — eu teria uns dois anos e tu uns sete — deste uma reprimenda à mãe porque ela não estava, supostamente, a tomar conta de mim. Aquela vez que me atiraste um iogurte à cara, ainda que sem sucesso. Aquelas vezes, impossíveis de contar, em que gritaste à mãe. Aquelas vezes, impossíveis de contar, em que te fechaste no quarto durante dias — se não foram dias, pareceram. De onde é que vens? Que solidão tão estridente é essa? Onde é que eu falhei? Diz a mãe e eu sublinho e volto a perguntar: Onde? E isto não é retórica, é um texto para uma doença incurável. Um dia gostava de resolver o meu irmão. Um dia gostava de tirar a dor à minha mãe.
Ficha Artística / Técnica
autor: Miguel Branco
apoio à criação: João Jacinto e Pedro Nunes
Apoio à criação: Residência Artística: fAUNA | habitat de criação – Teatro da Didascália; O Espaço do Tempo
Este projeto de escrita é feito ao abrigo de uma Bolsa de Criação Literária da DGLAB/MC;
Sobre Miguel Branco
Miguel Branco nasceu em Almada em 1991. Começou pelo jornalismo cultural e tornou-se dramaturgo quando se cruzou com a Companhia Mascarenhas-Martins. Há dois anos que eu não como pargo; Lama ressequida com marcas de carro; Um pano em Vancouver; A última fatia de bacon; e O golfinho André são algumas das suas peças. Em 2022 editou Quatro peças para outras formas de vida (Urutau). Foi um dos seleccionados para a Bolsa de Criação Literária 2022 — modalidade: dramaturgia — da DGLAB/MC.